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SLOW LIFE

Como o casal de médicos Carlos e Thais Freire, que vivem a rotina acelerada da medicina, conseguem adicionar ao cotidiano da família pequenos ritos de bem-estar e de saúde para desfrutar da vida plenamente


TEXTO VINÍCIUS LIMA FOTOS JOÃO PAULO SANTOS

Já ouvi dizer que medicina é um sacerdócio. Colocando de lado os significados literais de origem eclesiástica, o próprio dicionário esclarece que, no sentido figurado, o termo significa “função que apresenta caráter nobre e venerável em razão do devotamento que exige”. Algumas horas com o casal de médicos Carlos Freire (ginecologista) e Thais Michelleti Freire (endocrinologista) foram suficientes para compreender que, sim, a medicina é uma profissão de se doar e de se entregar em favor de uma causa maior: a saúde do próximo.


O título que perfaz este artigo é “slow life” exatamente pelo fato de que este termo de origem inglesa é o nome para um movimento contemporâneo que defende um estilo de vida desacelerado, voltado para a simplicidade de vivenciar o presente. Esse movimento ganhou repercussão em diferentes esferas do cotidiano e significados específicos, como Slow Fashion (que valoriza tecelãs locais e roupas com menor impacto ambiental), Slow Food (alimentos frescos, preparados na hora, com ingredientes da estação e cultivo orgânico) e Slow Medicine (a medicina com atendimento humanizado, dedicado ao humano de forma integral e não apenas à enfermidade).


Pioneiros em trazer estes conceitos para a medicina local, Carlos e Thais Freire perceberam ao longo da carreia de 15 anos em Maringá que, em âmbito pessoal, a vida também pedia para tirar o pé do acelerador. “Medicina é uma profissão que exige muita dedicação, por muito tempo eu não sabia o que era conviver com minha família fora do período de férias, foi quando percebemos que nossa vida não estava alinhada com o discurso da medicina de ‘cuide-se bem’. Era preciso mudar nossa forma de viver nosso cotidiano”, esclarece o doutor Freire.


Como parte dessa fase de transformações, eles abriram em conjunto a sua própria clínica médica, a Sanvie, onde os atendimentos são agendados de forma espaçada, com um volume de pacientes diários que representa menos de 1/3 da quantidade de atendimentos feitos diariamente no início de suas carreiras. “Não foi só nós que ganhamos com isso, mas os pacientes também, porque em cada consulta nós conhecemos a pessoa, a vida que ela leva, seus hábitos e rotinas que podem gerar as patologias. É muito mais eficaz combater as causas do que apenas os sintomas”, explica a Dra Thais.


Com este tempo adicional, o casal pôde resgatar antigos hobbies e descobrir novos. Thais, que tocou piano durante 9 anos em sua mocidade, redescobriu seu próprio piano, que fica em região nobre da casa. Esta última que há 10 anos foi reformada por meio de uma arquiteta, agora ganhou nova roupagem com a curadoria da própria Thais. “Da última reforma só sobrou uma parede, o restante eu mudei tudo”.


A entrada da WIT na casa da família Freire colocou em evidência outras duas paixões do casal: as orquídeas e a gastronomia. Uma profusão de vasos adorna ambientes sociais interno e externo, dividindo espaço com livros de receita em estantes e aparadores.


Foi comendo alguns petiscos low carb que descobrimos que a paixão do casal pela gastronomia, e de Thais pela cozinha, tem tudo a ver com a área de especialidade dela. A endocrinologia é uma área da medicina que se dedica a estudar o funcionamento dos hormônios, substâncias responsáveis por regular diversas funções em nosso organismo, como o crescimento, o desenvolvimento das características sexuais, a absorção de açúcar e de cálcio, o ciclo de sono e vigília e o equilíbrio entre apetite e saciedade. Ali mesmo na bancada da cozinha recebemos uma aula incrível sobre a história da obesidade e compreendemos que o trigo e o arroz são alimentos incorporados pela nutrição humana há pouquíssimo tempo na história evolutiva da nossa própria raça, e que isso tem incontáveis implicações em nossa saúde e em nosso peso. Quem diria que a soberania do arroz e do feijão pudesse ser, um dia, questionado? Descobrimos também que as carnes em geral estão entre os melhores alimentos termogênicos que existem, além de garantirem a sensação de saciedade por até 5 horas. Fica a dica!


ENCONTROS DA VIDA

Eles se conheceram em Bragança Paulista na ocasião em que ela fazia residência em Clínica Médica e ele estava no sexto ano de medicina. Quando a doutora Thais terminou sua residência eles já estavam noivos, ainda assim ela veio sozinha para Maringá se especializar em endocrinologia enquanto o doutor Carlos foi para Santos, litoral de São Paulo, onde fez residência em ginecologia e onde também teve o privilégio de integrar a primeira equipe do Dr. Francesco Antonio Viscomi, médico responsável por trazer ao Brasil a cirurgia por vídeo, em um curso de pós graduação ministrado no Hospital Sírio-Libanês em São Paulo.


Foram 5 anos de relacionamento à distância até a chegada do casamento, que aconteceu aqui mesmo em Maringá, cidade pela qual se apaixonaram e fixaram suas raízes. “Meu professor de física do Ensino Médio disse e eu nunca esqueci: ‘escolha bem a cidade onde você vai morar, é impossível ser feliz em uma cidade que você não gosta’”, lembra Thais, uma mulher movida por suas memórias e convicções. Outro conselho do qual ela não se esquece e que também determinou seu futuro, foi do professor de matemática: “enquanto vocês ficam fazendo planos de relaxar no fim de semana, tem sempre um japonês estudando para tomar seu lugar no vestibular”. Thais levou essa dica tão a sério que ela passou em medicina na Universidade São Francisco de Campinas em seu primeiro vestibular. “Você tem origem nipônica?”, pergunto. Rindo, ela conta sobre sua origem espanhola e sua dupla cidadania.


Os dias de introspecção que o mundo foi forçado a viver em 2020 apenas acelerou as mudanças que já estavam em curso na família Freire. Se tem uma lição que pudemos aprender com a pandemia foi o resgate de valores fundamentais e milenares. “Todo mundo reclama da vida corrida, e quando tá calmo reclamam também. As pessoas estão perdendo a oportunidade de aproveitar como é bom ficar em casa”, conclui Dr Carlos.












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