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Raridade no ar

Um sonho de infância foi a motivação que levou o empresário Jeferson Platzeck Estrella a se tornar proprietário de uma aeronave única no Brasil, o Waco YMF-5, avião popular nos Estados Unidos no período entre-guerras e que hoje é uma verdadeira relíquia


TEXTO VINÍCIUS LIMA FOTOS RAPHAEL GUIMARÃES


Os céus de Maringá e região têm sido sobrevoados por uma Waco YMF-5, uma aeronave muito rara, projetada no período entreguerras, nos Estados Unidos. O proprietário e piloto dessa raridade é Jeferson Platzeck Estrella, empresário há muito tempo apaixonado por aviação.


Jeferson tinha apenas 5 anos quando fez seu primeiro voo, no avião de um amigo da família. Pouco tempo depois sua avó materna comprou um avião para trabalhar, era um Skylane 182, um monomotor asa alta de quatro lugares fabricado pela Cessna nos Estados Unidos. “Eu lembro como se fosse hoje, era um avião branco e vinho, eu me apaixonei, senti que voar era a coisa mais gostosa do mundo”, relembra Jeferson.


Naquela época, Jeferson vivia com a família em Presidente Venceslau, um município do interior de São Paulo que fica a apenas 35 km da fronteira com o Mato Grosso do Sul, cujo principal acesso por via rodoviária é atravessando a ponte Hélio Serejo, inaugurada em 1964 como a ponte mais extensa do Brasil, com 2.550 m (posto perdido 10 anos depois para a ponte Rio–Niterói, que segue até hoje como a maior do hemisfério sul em concreto protendido e a maior da América Latina, com mais de 13 km de extensão). Mesmo com tamanha infraestrutura rodoviária disponível, o acesso às propriedades rurais no Estado vizinho não era nada fácil, por isso a maioria dos proprietários de terra da região de Presidente Venceslau possuíam aviões particulares.


Jeferson conta que, durante toda sua infância e adolescência, seu principal programa entre amigos era pegar a bicicleta e ir brincar no aeroporto da cidade, na esperança de ser convidado para um voo, o que segundo ele acontecia com muita frequência. “Quando alguém ia dar uma volta com o avião, ou fazer um ‘turno de pista’ para a aeronave não ficar muito tempo parada, se me chamasse eu ia correndo”, conta Jeferson. Turno de pista é uma expressão entre os pilotos civis para designar o voo em torno do campo representado por um único circuito, no qual o piloto executa uma decolagem e uma aterrissagem. Jeferson esclarece também que este aeroporto era extremamente simples, até mesmo a pista de pouso e decolagem era de terra batida, fazendo jus a toda a paisagem rural do seu entorno.


Presidente Venceslau era uma cidade muito próspera em virtude do agronegócio, e tem um histórico muito interessante na aviação executiva graças aos muitos moradores que tinham fazenda no Mato Grosso do Sul. Tanto é que a cidade dispunha de uma oficina mecânica exclusiva para aviões, a oficina do seu Artêmio, homem tão influente na história da aviação local que, anos mais tarde, teve a honra de ser homenageado pelo município, que conferiu seu nome ao Aeroporto Artêmio Pereira de Godoy, que fica a apenas 5,5 km do centro da cidade. “Não só em Presidente Venceslau, mas em todas as cidades vizinhas, o seu Artêmio era muito conhecido, além de fazer a parte mecânica, ele também era responsável pela importação de aeronaves americanas… Calculo que ele foi pelo menos 30 vezes para os Estados Unidos para trazer aviões de lá”, explica Jeferson.

Seu Artêmio trouxe aeronaves importadas até o ano de 1974, quando o governo militar proibiu a importação de carros, aeronaves e outros bens, uma realidade que só mudou na década de 1990 quando o presidente Fernando Collor de Mello deu início a abertura da economia para as importações. Tanto é que hoje o Brasil é o segundo maior mercado do mundo em aviação executiva, perdendo apenas para os Estados Unidos.


WACO YMF-5


Embora o sonho de ser aviador iniciou cedo na vida de Jeferson, ele se desligou desse sonho aos 17 anos quando começou a trabalhar em uma concessionária de motos. Aos 22 anos recebeu por herança uma terra em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, quando passou a dedicar-se à pecuária. As aeronaves só voltaram a fazer parte do seu imaginário quando, com 28 anos, surgiu a oportunidade de comprar junto de outros 14 amigos um Cherokee 180, ano 1968, fabricado pela Piper. Foram 2 anos entre encontrar o avião, importar e reformar, com todas as burocracias imagináveis para a importação de peças e nacionalização de uma aeronave americana. Neste meio tempo, Jeferson fez o curso de piloto, estudando de casa através de CDs e provas de simulado, até conseguir passar na prova da ANAC e fazer seu primeiro voo solo aos 30 anos de idade no Cherokee 180.


Hoje com 52 anos, Jeferson pilota há mais de duas décadas. Ele já teve diversas aeronaves, dentre as quais um Beech Bonanza V35, um Baron E55, e um Baron 58, que tem até hoje e é usado para trabalho e viagens. Mas ter um biplano, como o Waco, era um sonho de infância.


Quando criança, seu brinquedo preferido era um biplano de cor azul. O tempo não foi capaz de apagar essa memória afetiva, tanto é que anos mais tarde, assistindo ao filme Pearl Harbor com a família, na cena final em que o personagem Rafe volta para os Estados Unidos em um Waco, Jeferson anunciou para os presentes: “um dia terei um avião como esse”.


Em 2019 Jeferson foi para os Estados Unidos conhecer de perto a fábrica da Waco, marca que surgiu na década de 1920 e foi responsável pela fabricação de aviões usados como “treinador” pela força aérea norte-americana. A fábrica, porém, encerrou suas operações no fim da década de 1940 quando surgiram aeronaves de performance superior e os biplanos se tornaram obsoletos. Até que, em 1983, um grupo de empresários de Michigan decidiram comprar a Waco e desde então o avião tem sido produzido artesanalmente, com base nas técnicas originais da década de 1920.


A fila de espera para quem encomenda um Waco YMF-5 pode chegar a dois anos e meio. O de Jeferson foi comprado de um empresário de Rio Claro que estava mudando para a Itália, e que coincidentemente tinha um Waco na cor azul, a mesma do biplano de brinquedo da infância de Jeferson. Incentivado pela esposa Leny, ele investiu no próprio sonho. “O apoio da minha esposa foi fundamental na compra do Waco, ela me encorajou dizendo que era uma oportunidade única”.


Hoje o Waco de Jeferson fica na Pousada das Águias, um condomínio aeronáutico privado localizado no município de Presidente Castelo Branco, onde a Revista WIT, em parceria com a ROAN Boutique de Imóveis, realizou um evento voltado para o público masculino com o objetivo de revelar de perto essa aeronave que possivelmente é a única no país. “Que tenho conhecimento, existem outros dois que são da década de 1940, e que foram restaurados, mas dessa geração nova fabricada pós 1983 o meu é o único”, conclui Jeferson.








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