top of page

Por onde anda essa tal felicidade?!

TEXTO DE FERNANDO DAIBERT, PSICÓLOGO

Em 1973 Felix Guattari lançava o livro Três Ecologias e nos primeiros parágrafos trazia um questionamento frente a sua perspectiva do que seria o futuro. Dizia ele "O que está em questão é a maneira de viver daqui em diante sobre esse planeta, no contexto da aceleração das mutações técnico-científicas e do considerável crescimento demográfico. Em função do contínuo desenvolvimento do trabalho maquínico redobrado pela revolução informática, as forças produtivas vão tornar disponível uma quantidade cada vez maior do tempo de atividade humana potencial. Mas com que finalidade? A do desemprego, da marginalidade opressiva, da solidão, da ociosidade, da angústia, da neurose, ou a da cultura, da criação, da pesquisa, da re-invenção do meio ambiente, do enriquecimento dos modos de vida e de sensibilidade?" 


Onde entra a felicidade nessa história?! Quando pensamos nessa condição, podemos perceber que estamos frente a uma escolha a ser feita, tanto individual como coletiva. Mas o que seria a tal felicidade?!


A psicologia positiva estuda a felicidade e entende em linhas gerais que a mesma está relacionada a uma ideia de “bem estar subjetivo”. Para poder “medir” com segurança esse conceito, fez-se necessário dividi-lo em seus componentes essenciais. Martin Seligman, reconhecido como fundador da psicologia positiva, definiu 5 componentes determinantes da felicidade: emoções positivas, engajamento, relacionamentos, sentido e propósito, e senso de realização.

A importância das emoções positivas nesse contexto é quase óbvia, já que elas remetem às boas sensações que temos frente a determinadas situações. Shawn Achor, um pesquisador de Harvard fala sobre o benefício da felicidade, onde através da prática de pequenas ações diárias conseguimos implementar essas sensações ao longo do dia, transformando a forma como percebemos a realidade ao nosso redor.


Atitudes como a gratidão, a prática de atividades físicas, a meditação, a generosidade intencional, são alguns dos exemplos de pequenas ações que são capazes de injetar sensações positivas no nosso organismo e fazer com que a nossa percepção da realidade seja mais agradável e, consequentemente, que tenhamos uma vida melhor.


O engajamento ou “flow” se refere a um conceito desenvolvido por Mihaly Csikszentmihalyi e diz respeito a nossa capacidade de se entreter em uma atividade a tal ponto que não somos capazes nem mesmo de perceber a passagem do tempo. Isso acontece quando gostamos da atividade que desenvolvemos, e ela não é nem tão fácil a ponto de nos entediar, nem tão difícil a ponto de nos intimidar. Quem nunca?! O engajamento gera uma sensação de bem estar no final, e é extremamente necessário no nosso desenvolvimento, tanto intelectual como emocional.


Quando falamos de relacionamentos, estamos falando de conexões autênticas, de relacionamentos que fazem sentido e nos fazem sentir a vida. Somos seres relacionais, muito mais do que racionais. Nascemos em relação, e muitas vezes a qualidade dessa relação inicial vai ser capaz de determinar a qualidade das relações que desenvolvemos ao longo da vida. Peter Siegel, Shore entre outros pesquisadores já comprovaram como a relação entre duas pessoas altera o funcionamento do cérebro, podendo nos aliviar de sensações de dores, de sofrimento, etc... Uma das pesquisas mais extensas de Harvard, que acompanhou e ainda acompanha diversas pessoas ao longo de suas vidas, constatou que as pessoas que tinham mais relações significativas acabam vivendo mais e com mais saúde. Entre os fatores relacionados estava o fato de que possuem relacionamentos autênticos, costumam se cuidar mais, têm mais compromissos, têm alguém a quem recorrer em momentos difíceis etc...


Sentido e propósito são fatores que se conectam diretamente a algum por quê de fazermos algo. Existe um conceito chamado utopia ativa que ouvi de um professor uma vez mas talvez o representante mais importante nessa área seja Victor Frankl, criador da Terapia do Sentido ou Escola da Logoterapia. Ele foi um prisioneiro em Auschwithz. Enquanto estava lá vivendo o inferno dos campos de concentração, observou que haviam basicamente 3 tipos de pessoas. Um primeiro grupo que acreditava que a guerra acabaria e que eles seriam salvos por alguém, por algum “salvador”. Um segundo grupo que acreditava que estavam perdidos e que não sairiam dali de forma alguma. E um terceiro grupo, no qual se incluía, que acreditava que a vivência seria terrível, dolorosa, e provavelmente longa, mas mesmo assim eles precisariam continuar vivos porque tinham uma razão para isso, um motivo além, para suportar tanto sofrimento.


As pessoas do primeiro grupo eram as primeiras a morrer, tinham uma visão “mágica” da realidade que simplesmente não condizia com fatos, e acabaram esmorecendo frente às dificuldades encontradas. O segundo grupo, com uma visão pessimista da realidade suportou mais as dificuldades esperadas mas acabou encontrando o mesmo fim do grupo anterior. Já o terceiro grupo, provavelmente por essa perspectiva de saber que ainda teriam muito o que fazer, resistiu até a libertação. O sentido encontrado por Frankl serviu de combustível para suportar as dificuldades enfrentadas, e posteriormente desenvolver o seu trabalho que ajudou e ainda ajuda muitas pessoas pelo mundo afora. Quando encontramos o porquê, o “como” se torna apenas o caminho a ser trilhado.


Por último temos o senso de realização, que é definido pela nossa capacidade de perceber as pequenas conquistas atingidas ao longo do caminho que trilhamos. Esses pequenos desafios vão dando significado a essa construção maior que chamamos de vida. São pequenos pontos finais na história que escrevemos e que um dia terá um final definitivo. Uma obra que pintamos e que um dia ficará pronta.


Diante disso tudo, mesmo em um momento de crise ou pandemia, por mais estranho que pareça: cabe somente a nós escolher se o final será feliz ou não. Faça a sua escolha.


Fique bem.



Comments


bottom of page