O AVE (Acidente Vascular Encefálico), comumente conhecido por AVC, é um trauma que pode acarretar em diferentes sequelas neurológicas. Entenda como a reabilitação neurofuncional, uma especialidade da fisioterapia, pode ser crucial no processo de reabilitação destes pacientes
por Dr. João Vitor Oblanca, CREFITO/8 206377-F
Quando o assunto é AVE, um dos principais mitos a serem combatidos é o de que os acidentes vasculares encefálicos sempre têm a mesma severidade. Assim como o sistema de vasos sanguíneos que irriga nosso cérebro com nutrientes e oxigênio é extremamente rico e variado, as consequências de uma falha nesse sistema também pode incorrer em tipos muito diversos de consequências. Por exemplo: quando o AVE afeta uma região mais extensa do sistema nervoso central ou uma região que controla batimentos cardíacos, respiração, ciclo de vigília de sono, etc. este tende a exigir uma recuperação mais lenta. A severidade impacta no processo de recuperação, mas não é o fator principal.
Fatores emocionais como motivação e resiliência têm impacto direto na qualidade de recuperação destes pacientes. Costumo dizer que a velocidade da recuperação tem mais a ver com a pessoa que você era antes do AVE do que com as debilidades adquiridas após este evento traumático. Pessoas motivadas, que enfrentam seus problemas com maior otimismo e que possuem uma rede de apoio forte (parentes e amigos) tendem a ter maior êxito na recuperação e no objetivo de voltar a ser participantes de suas próprias vidas. Pesquisas apontam também que pessoas com nível socioeconômico maior, pessoas que têm um terceiro grau e que praticavam atividade física regularmente também têm uma recuperação mais rápida. Da mesma forma, pacientes de AVE que são tratados por fisioterapeutas com formação direcionada exclusivamente para recuperação e restauração neurológicas têm a tendência de voltar antes para suas atividades cotidianas.
Como fisioterapeuta compreendo que o meu papel também é este, o de motivar, de ouvir, entender e ajudar o paciente a retificar dentro de si os motivos que o levam a perseverar no processo de reabilitação. Comparo meu trabalho ao que um Coach é para um atleta, pois a capacidade do paciente se manter ativo fora do ambiente terapêutico também tem papel determinante em sua recuperação, aliás, como tudo na vida: o aluno de piano que vai na aula apenas uma vez por semana tem um desenvolvimento inferior se comparado ao aluno que pratica meia hora por dia.
Nessa jornada, às vezes longa, de recuperação, canalizo para o paciente tão somente aquilo que é necessário para seu desenvolvimento físico. Os assuntos correlatos, que envolvem atividades que escapam do controle do paciente (como ir ao médico e outras atividades que demandam apoio de terceiros) direciono exclusivamente para a família, que é um dos núcleos mais importantes em qualquer tratamento. O fato de meu tratamento ser domiciliar também ajuda na integração da família ao tratamento.
Costumo dizer que eu amplio minha equipe logo na primeira consulta, mobilizando a família e fazendo todos trabalharem em um mesmo objetivo, porque a reabilitação é ativa: o paciente faz exercícios estudados individualmente para serem adaptados ao seu nível de função, e a família e amigos selam tudo isso com o apoio sócio-emocional.
O cérebro é uma ferramenta fabulosa e tem uma plasticidade incrível, o que significa que diferentes regiões do cérebro podem aprender funções perdidas em um AVE. No caso de debilidades motoras, o cérebro só aprende com exercícios ativos, ou seja, o fisioterapeuta pode até guiar, mas é o paciente quem deve executar o movimento, com repetição e frequência. Quando o paciente está cansado, aí entra meu papel de “coach” de dizer “falta pouco”, “só mais um” e “você consegue!”.
O fisioterapeuta sai da universidade com uma visão muito mecânica, conhecendo de músculo, cérebro, movimento e biomecânica, mas em minha jornada profissional percebi que é preciso entender que existe em cada paciente um ser humano com sentimento e se eu fomentar os sentimentos positivos o resultado será muito melhor.
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